STJ Banco responde por vazamento de dados que resultou em aplicação do “golpe do boleto” contra cliente
A Terceira Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a instituição financeira responde pelo
vazamento de dados pessoais sigilosos do consumidor, relativos a operações e
serviços bancários, obtidos por criminosos para a prática de fraudes como o
"golpe do boleto". Nesse tipo de estelionato, golpistas se passam por
funcionários de um banco e emitem boleto falso para receberem indevidamente o
pagamento feito pelo cliente.
O colegiado reformou acórdão do
Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e restabeleceu a sentença que
condenou um banco a declarar válido o pagamento realizado por meio de boleto
fraudado e devolver à cliente parcelas pagas indevidamente em contrato de
financiamento.
De acordo com o processo, a
cliente encaminhou e-mail para o banco solicitando informações
sobre como quitar a operação. Dias depois, ela foi contatada pelo WhatsApp por
uma suposta funcionária da instituição e recebeu um boleto no valor de cerca de
R$ 19 mil. A cliente pagou o boleto, mas depois descobriu que o documento havia
sido emitido por criminosos.
Para o TJSP, o golpe contra a
cliente foi aplicado por meio de negociações realizadas de maneira informal. O
tribunal também considerou que as informações do boleto falso divergiam dos
dados constantes do contrato de financiamento e que a consumidora falhou em seu
dever de segurança e cautela.
Bancos respondem por danos
causados em fraudes praticadas por terceiros
A ministra Nancy Andrighi,
relatora do recurso da cliente, explicou que, nos termos da tese fixada no
julgamento do Tema Repetitivo 466 – que contribuiu para a
edição da Súmula 479 do STJ –, as instituições bancárias respondem
objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno em caso de fraudes
praticadas por terceiros, tendo em vista que a responsabilidade decorre do
risco da atividade.
Em relação aos chamados golpes de
engenharia social, a relatora comentou que os criminosos costumam conhecer os
dados pessoais das vítimas e, com base neles, usam técnicas psicológicas de
persuasão – a exemplo da simulação de um atendimento bancário verdadeiro – como
forma de atingir seu objetivo ilícito.
"Assim, para imputar a
responsabilidade às instituições financeiras, no que tange ao vazamento de
dados pessoais que culminaram na facilitação de estelionato, deve-se garantir
que a origem do indevido tratamento seja o sistema bancário. Os nexos de
causalidade e imputação, portanto, dependem da hipótese concretamente
analisada", ponderou a ministra.
Nesse cenário, a ministra apontou
que não poderia ser imputada ao banco a responsabilidade exclusiva no caso de
vazamento de dados cadastrais básicos, como nome e CPF, porque essas
informações podem ser obtidas por fontes alternativas. Por outro lado, caso os
dados do consumidor sejam vinculados a operações e serviços bancários, a
instituição tem o dever de armazenamento e proteção, sob pena de eventual
vazamento configurar falha na prestação do serviço.
LGPD também prevê
responsabilidade por falhas de segurança
Nancy Andrighi destacou que, nos
termos do artigo 44 da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD),
o tratamento de dados será irregular quando não fornecer a segurança que o
titular espera, considerando-se o resultado e os riscos desse tratamento.
No caso analisado, a ministra
reforçou que, segundo as informações dos autos, os criminosos detinham dados
pessoais da cliente referentes às suas operações bancárias. A relatora também
apontou que, embora o boleto falso tivesse diferenças em relação aos documentos
verdadeiros, não se espera que uma pessoa comum seja sempre capaz de
identificá-las.
Segundo a relatora, algumas
circunstâncias pesam a favor da responsabilização do banco: o estelionatário
tinha conhecimento de que a vítima era cliente da instituição financeira, sabia
que ela encaminhou e-mail com a finalidade de quitar sua
dívida e também possuía dados relativos ao financiamento. Essas informações,
sobretudo os dados pessoais bancários, são sigilosas, e seu tratamento incumbe
à entidade bancária com exclusividade, concluiu a ministra ao restabelecer
a sentença.
Leia o acórdão no REsp 2.077.278.
Esta notícia refere-se
ao(s) processo(s):REsp 2077278
Comentários
Postar um comentário