Responsabilidade Civil
Por Tábata Viapiana
A violência de gênero não está restrita à lesão física, sendo que, nas demais modalidades, pode ser igualmente danosa. Com base nesse entendimento, a MERGEFIELD "Órgão Julgador#Retorna o nome da vara onde está o processo=8@PROC"6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou um homem a indenizar a ex-mulher em R$ 20 mil por danos morais, psicológicos e
patrimoniais durante o relacionamento, que durou cerca de sete anos.
Homem terá que indenizar a
ex-mulher em R$ 20 mil por danos morais, psicológicos e patrimoniais durante a
relação de sete anos
O juízo de primeira instância
julgou parcialmente procedente a ação de reconhecimento e dissolução da união
estável, com partilha igualitária dos bens móveis do ex-casal. No recurso ao
TJ-SP, a mulher insistiu na indenização por danos morais e psicológicos, pois
alegou ter vivido um relacionamento abusivo com o réu.
Gravações de áudio e mensagens de
texto anexados aos autos indicam que o homem proferia insultos, controlava o
uso dos recursos do casal e ameaça se desfazer de objetos da mulher caso ela
não lhe entregasse todo o salário. A vítima informou, ainda, que precisou se
submeter a tratamento psicológico após o término da união.
Neste cenário, a relatora,
desembargadora Ana Zomer, entendeu que os danos ficaram configurados. Ela
destacou que o artigo 5º da Lei Maria da Penha estabelece que, "para os
efeitos desta lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher
qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão,
sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial".
"O artigo 6º do mesmo
diploma legal confere ainda maior importância ao tema e lhe garante status de
proteção constitucional, ao considerar que 'a violência doméstica e familiar
contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos'. Neste
particular, a questão diz respeito a diversas ações intentadas pelo requerido
na constância da união estável que teriam causado sofrimento psicológico, moral
e patrimonial à recorrente", afirmou.
Zomer também citou o artigo 7º da
Lei Maria da Penha, que elenca as várias formas de violência doméstica, como
violência psicológica, patrimonial e moral. "Sobre o tema da violência de
gênero, preleciona Silvia Chakian que esta não está restrita ao âmbito da lesão
física, sendo que, nas demais modalidades, pode ser igualmente danosa",
completou.
Para a magistrada, o cometimento
de ato ilícito pelo réu é "patente", pois o conjunto probatório é
robusto no sentido de "estampar a agressividade com que ele se dirigia à
ex-companheira". Segundo a relatora, ficou demonstrada a ocorrência de
três formas de violência previstas na Lei Maria da Penha: moral, psicológica e
patrimonial.
"O requerido proferia
diversos insultos contra a ora apelante nas situações mais cotidianas, insultos
este extremamente ofensivos à sua honra, inclusive caluniosos, já que se refere
a ela como 'ladra', acusando-a de furto, sem apresentar provas de tal alegação;
controlava o uso do patrimônio comum e ameaçava de se desfazer de objetos
adquiridos pela requerente", acrescentou Zomer.
Ela apontou vários episódios de
xingamentos, ameaças e humilhações, o que indica que tal comportamento era
corriqueiro, "capaz de estampar a abusividade do relacionamento mantido
entre as partes": "Outra prova são os depoimentos amealhados aos autos,
que, embora não se refiram ao período da união, mostram como foi o início do
relacionamento, já explanando a prática de atos violentos, que se
seguiram."
Assim, a conclusão da magistrada
foi de que a separação do casal foi marcada por intensa violência de cunho
doméstico, o que, por si só, revela a gravidade do ocorrido e o sofrimento
psíquico da mulher, "insultada,
humilhada gravemente em sua honra e controlada financeiramente". Ela
também disse que a autora demonstrou os prejuízos em sua esfera emocional
decorrentes da conduta do réu.
"As questões atinentes à
violência de gênero, em quaisquer de suas modalidades, devem ser tratadas com a
mais ampla e efetiva proteção possíveis. O que está em jogo é, no mais das
vezes, a vida e integridade física/psíquica da vítima, bens cuja tutela é de
imperiosa e indiscutível importância. Não se pode, de modo algum, esperar que o
pior aconteça para que o Estado Juiz intervenha, pois, na esmagadora maioria
dos casos, as ameaças, constrangimentos e agressões ocorrem de modo velado, dentro
da própria residência, onde, frequentemente, somente o próprio algoz e a vítima
são testemunhas do mal feito."
Ainda segundo Zomer, os abusos de
ordem psicológica, muitas vezes, são igualmente intensos ou até maiores que os
abusos físicos e podem levar a consequências extremas. "O papel do
julgador deve ser o de assegurar que o dano sofrido pela vítima seja
devidamente reparado. Por certo, não é dado ao Judiciário compactuar com este
inaceitável estado de coisas, especialmente por ser ele o poder em cujas portas
se bate diante das mais flagrantes violações de direito", disse.
Por fim, a desembargadora
ressaltou que a possibilidade de arbitramento de indenizações em casos de
violência doméstica contra a mulher é pacífica, tanto que o Superior Tribunal
de Justiça permite até mesmo que o juiz criminal o faça diretamente em
processos submetidos à sua apreciação, desde que haja pedido.
A relatora ainda citou o Tema 983 do STJ, que diz que, "nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de instrução probatória". A decisão do TJSP foi por unanimidade.
Processo MERGEFIELD "Número
do Processo#Retorna o número do
processo=1@PROC"1017520-98.2017.8.26.0344
Brave
Tábata Viapiana
é repórter da revista Consultor
Jurídico
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