A presunção de legitimidade dos
atos administrativos com fundamento no princípio da legalidade não é absoluta e
admite prova em contrário. Com base nesse entendimento, a juíza Fernanda Peres,
da 1ª Vara da Fazenda Pública de Santos (SP) anulou multa imposta a um
restaurante por infração sanitária durante a pandemia de Covid-19.
“A prova produzida pela parte
autora desafia a veracidade do ato administrativo impugnado, mormente porque no
Auto de Infração e Imposição de Multa (AIIM) há mera alusão acerca da não
utilização da máscara facial por parte de funcionários, sem especificá-los, e
porque a requerida não produziu nenhuma contraprova que pudesse se contrapor
àquela produzida pela autora”, anotou a juíza.
Conforme o AIIM lavrado por
agentes da Guarda Civil Municipal de Santos, o restaurante “foi autuado por
estar descumprindo o referido decreto, onde no interior do estabelecimento,
funcionários não utilizavam máscara facial”. Amparada pelo Decreto Municipal nº
8.944/2020, a multa foi de R$ 3 mil. Por negar a prática da infração e
discordar da sanção, o responsável pelo comércio ajuizou ação anulatória.
A advogada Karla Ingrid
Santana Vieira representa o restaurante e alegou na inicial que o auto
de infração possui informações genéricas, “de forma a prejudicar a ampla defesa
e o contraditório, cabendo ao juízo reconhecê-lo como nulo”.
Segundo ela, os funcionários
flagrados sem máscara de proteção almoçavam durante a fiscalização da GCM, não
sendo cabível lhes imputar, naquela circunstância, violação à regra sanitária.
A defesa do estabelecimento
também juntou aos autos fotos tiradas do sistema de monitoramento eletrônico do
local. As imagens mostram os colaboradores usando máscara de proteção facial à
época dos fatos. Em sua contestação, a Prefeitura sustentou a legalidade da
multa, porque a infração foi constatada por guardas municipais com competência
para esse tipo de fiscalização e dotados de fé pública.
Ilegalidade constatada
De acordo com a juíza Fernanda
Peres, a sua análise recai apenas sobre a legalidade (material e formal) e
legitimidade do ato impugnado pelo autor. Sob pena de interferir nas razões de
conveniência e oportunidade típicas da Administração Pública, o que violaria a
independência dos Poderes, ela explicou não caber ao Judiciário reexaminar ou
alterar o mérito da decisão administrativa.
Com essa ressalva, a julgadora
concluiu que o estabelecimento demonstrou a ilegalidade do ato combatido. Ela
citou o depoimento de uma testemunha, ouvida mediante compromisso na audiência
de instrução. Essa testemunha confirmou as alegações da inicial, em especial o
fato de os funcionários estarem sem máscara porque a fiscalização ocorreu no
momento em que se alimentavam.
A mesma testemunha acrescentou
que os demais empregados, que não faziam refeição na ocasião, utilizavam o
equipamento de proteção. Por outro lado, conforme destacou a magistrada, a
municipalidade não produziu qualquer contraprova, como registros fotográficos,
por exemplo, e sequer arrolou como testemunhas os agentes públicos
participantes da diligência.
“A autora trouxe argumentos e
elementos de prova capazes de afastar a presunção de legalidade e veracidade do
ato, devendo-se concluir que indevida a imposição da multa”, decidiu Fernanda
Peres. Ao julgar a ação procedente e anular a multa, ela condenou a ré a arcar
com os honorários advocatícios. Por meio de nota, a Prefeitura de Santos informou
que aguarda ser intimada da sentença para recorrer.
1009872-48.2024.8.26.0562
- Sérgio Rodas – é editor da revista Consultor Jurídico no Rio de Janeiro.

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