STJ É cabível ação de exigir prestação de contas do alimentante contra a genitora guardiã do alimentado
É cabível ação de exigir de
contas ajuizada pelo alimentante, em nome próprio, contra a genitora guardiã do
alimentado para obtenção de informações sobre a destinação da pensão paga
mensalmente, desde que proposta sem a finalidade de apurar a existência de
eventual crédito.
O ingresso no ordenamento
jurídico da Lei n. 13.058/2014 incluiu a polêmica norma contida no § 5º do art.
1.583 do CC/2002, versando sobre a legitimidade do genitor não guardião para
exigir informações e/ou prestação de contas contra(o) a(o) guardiã(ão)
unilateral, devendo a questão ser analisada, com especial ênfase, à luz dos
princípios da proteção integral da criança e do adolescente, da isonomia e,
principalmente, da dignidade da pessoa humana, que são consagrados pela ordem
constitucional vigente.
Como os alimentos prestados são
imprescindíveis para a própria sobrevivência do alimentado, devem, ao menos,
assegurar uma existência digna a quem os recebe. Assim, a função supervisora,
por quaisquer dos detentores do poder familiar, em relação ao modo pelo qual a
verba alimentar fornecida é empregada, além de ser um dever imposto pelo
legislador, é um mecanismo que dá concretude ao princípio do melhor interesse e
da proteção integral da criança ou do adolescente.
Dessa forma, não há apenas
interesse jurídico, mas também o dever legal do genitor alimentante de
acompanhar os gastos com o filho alimentado que não se encontra sob a sua
guarda, fiscalizando o atendimento integral de suas necessidades,materiais e
imateriais, essenciais ao seu desenvolvimento físico e psicológico, aferindo o
real destino do emprego da verba alimentar que paga mensalmente, pois ela é
voltada para esse fim.
Por fim, o que justifica o
legítimo interesse processual em ação dessa natureza é exclusivamente a
finalidade protetiva da criança ou do adolescente beneficiário dos alimentos,
diante da sua possível malversação, e não o eventual acertamento de contas,
perseguições ou picuinhas com a(o) guardiã(ao), devendo ela ser dosada, ficando
vedada a possibilidade de apuração de créditos ou preparação de revisional,
pois os alimentos são irrepetíveis.
Veja o acórdão:
PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO
ESPECIAL. RECURSO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO NCPC. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS.
PENSÃO ALIMENTÍCIA. ART. 1.583, § 5º, DO CC/02. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO
JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. VIABILIDADE JURÍDICA DA AÇÃO DE EXIGIR CONTAS.
INTERESSE JURÍDICO E ADEQUAÇÃO DO MEIO PROCESSUAL PRESENTES. RECURSO ESPECIAL
PARCIALMENTE. PROVIDO.
1. Aplica-se o NCPC a este recurso ante os termos do Enunciado Administrativo
nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos
interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a
partir de 18 de março de 2016)
serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.
2. Não há falar em omissão ou negativa de prestação jurisdicional, na medida em
que o Tribunal gaúcho dirimiu, de forma motivada, as questões devolvidas em
grau de apelação, pondo fim à controvérsia dos autos.
3. O cerne da controvérsia gira em torno da viabilidade jurídica da ação de
prestar (exigir) contas ajuizada pelo alimentante contra a guardiã do
menor/alimentado para obtenção de informações acerca da destinação da pensão
paga mensalmente.
4. O ingresso no ordenamento jurídico da Lei nº 13.058/2014 incluiu a polêmica
norma contida no § 5º do art. 1.583 do CC/02, versando sobre a legitimidade do
genitor não guardião para exigir informações e/ou prestação de contas contra a
guardiã unilateral, devendo a questão ser analisada, com especial ênfase, à luz
dos princípios da proteção integral da criança e do adolescente, da isonomia e,
principalmente, da dignidade da pessoa humana, que são consagrados pela ordem
constitucional vigente.
5. Na perspectiva do princípio da proteção integral e do melhor interesse da
criança e do adolescente e do legítimo exercício da autoridade parental, em
determinadas hipóteses, é juridicamente viável a ação de exigir contas ajuizada
por genitor(a) alimentante contra a(o) guardiã(o) e representante legal de
alimentado incapaz, na medida em que tal pretensão, no mínimo, indiretamente,
está relacionada com a saúde física e também psicológica do menor, lembrando
que a lei não traz palavras inúteis.
6. Como os alimentos prestados são imprescindíveis para própria sobrevivência
do alimentado, que no caso tem seríssimos problemas de saúde, eles devem ao
menos assegurar uma existência digna a quem os recebe. Assim, a função
supervisora, por quaisquer dos detentores do poder familiar, em relação ao modo
pelo qual a verba alimentar fornecida é empregada, além de ser um dever imposto
pelo legislador, é um mecanismo que dá concretude ao princípio do melhor
interesse e da proteção integral da criança ou do adolescente.
7. O poder familiar que detêm os genitores em relação aos filhos menores, a
teor do art. 1.632 do CC/02, não se desfaz com o término do vínculo matrimonial
ou da união estável deles, permanecendo intacto o poder-dever do não-guardião
de defender os interesses superiores do menor incapaz, ressaltando que a base
que o legitima é o princípio já destacado.
8. Em determinadas situações, não se pode negar ao alimentante não-guardião o
direito de averiguar se os valores que paga a título de pensão alimentícia
estão sendo realmente dirigidos ao beneficiário e voltados ao pagamento de suas
despesas e ao atendimento dos seus interesses básicos fundamentais, sob pena de
se impedir o exercício pleno do poder familiar.
9. Não há apenas interesse jurídico, mas também o dever legal, por força do §
5º do art. 1.538 do CC/02, do genitor alimentante de acompanhar os gastos com o
filho alimentado que não se encontra sob a sua guarda, fiscalizando o
atendimento integral de suas necessidades materiais e imateriais essenciais ao
seu desenvolvimento físico e também psicológico, aferindo o real destino do
emprego da verba alimentar que paga mensalmente, pois ela é voltada para esse
fim.
9.1. O que justifica o legítimo interesse processual em ação dessa natureza é
só e exclusivamente a finalidade protetiva da criança ou do adolescente
beneficiário dos alimentos, diante da sua possível malversação, e não o
eventual acertamento de contas, perseguições ou picuinhas com a(o) guardiã(ao),
devendo ela ser dosada, ficando vedada a possibilidade de apuração de créditos
ou preparação de revisional pois os alimentos são irrepetíveis.
10. Recurso especial parcialmente provido.
(STJ – REsp n. 1.814.639/RS, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino,
relator para acórdão Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em
26/5/2020, DJe de 9/6/2020.)
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