STJ Em ação de busca e apreensão, mora do devedor não pode ser comprovada pelo envio de notificação por e-mail
A Terceira Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, estabeleceu que, em ação de busca e
apreensão regida pelo Decreto-Lei 911/1969, é inadmissível a comprovação
da mora do réu mediante o envio da notificação extrajudicial
por e-mail.
"Se é verdade que, na
sociedade contemporânea, tem crescido o uso de ferramentas digitais para a
prática de atos de comunicação de variadas naturezas, não é menos verdade que o
crescente uso da tecnologia para essa finalidade tem de vir acompanhado de
regulamentação que permita garantir, minimamente, que a informação transmitida
realmente corresponde àquilo que se afirma estar contido na mensagem e que houve
o efetivo recebimento da comunicação", afirmou a relatora, ministra Nancy
Andrighi.
Com base nesse entendimento, a
turma negou provimento ao recurso especial de um banco
contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), rejeitando a
tese de comprovação da mora após o envio da notificação extrajudicial
por e-mail.
No recurso especial, o banco
alegava que a comunicação dirigida ao endereço eletrônico seria válida para
constituir em mora o devedor fiduciante e que isso poderia ser
comprovado durante a instrução processual.
Uso da tecnologia tem de vir
acompanhado de regulamentação
Ao analisar o caso, a ministra
Nancy Andrighi lembrou que, originalmente, o Decreto-Lei 911/1969 exigia a comprovação
da constituição em mora por carta registrada em cartório ou por meio
de protesto do título, a critério do credor.
Nesse contexto, ela destacou que,
após a alteração do Decreto-Lei 911/1969 pela Lei 13.043/2014, passou-se a permitir que a
comprovação pudesse ocorrer mediante o envio de simples carta registrada com
aviso de recebimento, nem se exigindo, desde então, que a assinatura constante
do aviso fosse a do próprio destinatário.
"A expressão 'poderá ser
comprovada por carta registrada com aviso de recebimento' adotada pelo
legislador reformista deve ser interpretada à luz da regra anterior, mais
rígida, de modo a denotar a maior flexibilidade e simplicidade incorporadas
pela Lei 13.043/2014, mas não pode ser interpretada como se a partir de então
houvessem múltiplas possibilidades à disposição exclusiva do credor, como, por
exemplo, o envio da notificação por correio eletrônico, por aplicativos de mensagens
ou redes sociais", afirmou.
Nancy Andrighi lembrou ainda que,
em 2014, data da mudança legislativa, o e-mail já estava
amplamente difundido em todo o mundo, de modo que poderia o legislador, se
quisesse, incorporar essa forma de comunicação como suficiente para a
constituição em mora do devedor fiduciante.
"É correto concluir que a
legislação existente atualmente não disciplina a matéria, de modo que o envio
de notificação extrajudicial com a finalidade de constituição em mora apenas
por intermédio de correio eletrônico possui um vício apto a invalidá-la",
disse.
Comprovação de recebimento e
leitura não são possíveis nessa hipótese
A relatora também ressaltou não
ser possível considerar que, com o envio por e-mail, a notificação
extrajudicial atingiu a sua finalidade, pois a ciência inequívoca quanto ao
recebimento demandaria o exame de vários aspectos: existência de correio
eletrônico do devedor fiduciante, o efetivo uso da ferramenta por parte dele,
estabilidade e segurança da ferramenta de e-mail, entre outros.
"A eventual necessidade de
ampliar e de aprofundar a atividade instrutória, determinando-se, até mesmo, a
produção de uma prova pericial a fim de se apurar se a mensagem endereçada ao
devedor fiduciante foi entregue, lida, e se seu conteúdo é aquele mesmo
afirmado pelo credor fiduciário, instalaria um rito procedimental claramente
incompatível com os ditames do Decreto-Lei 911/1969", concluiu.
Leia o acórdão no REsp 2.022.423.
Esta notícia refere-se
ao(s) processo(s):REsp 2022423
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