A Terceira Turma do STJ, por
unanimidade, decidiu que “é ônus do credor não admitido no inventário o
ajuizamento da ação de conhecimento, não competindo ao juiz a conversão do
pedido de habilitação de crédito em ação de cobrança, em substituição às
partes”. A tese foi fixada no REsp 2.045.640, que teve como relator o
ministro Marco Aurélio Bellizze.
Veja o acórdão:
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL
CIVIL. HABILITAÇÃO DE CRÉDITO EM INVENTÁRIO. IMPUGNAÇÃO PELAS PARTES
INTERESSADAS. CONVERSÃO EM AÇÃO DE COBRANÇA PELO JUIZ. IMPOSSIBILIDADE.
ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS. DESCABIMENTO. ANULAÇÃO, DE OFÍCIO, DE ESCRITURA
PÚBLICA DE INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL. POSSIBILIDADE. ATO NULO. MATÉRIA DE ORDEM
PÚBLICA. JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.
CARACTERIZAÇÃO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Verifica-se que o Tribunal
de origem analisou todas as questões relevantes para a solução da lide, de
forma fundamentada, não havendo falar em negativa de prestação jurisdicional.
2. A existência de impugnação de interessado à habilitação de crédito em
inventário, impõe ao juízo do inventário a remessa das partes às vias
ordinárias, ainda que sobre o mesmo juízo recaia a competência para o
inventário e para as ações ordinárias (tal como ocorre nos juízos de vara
única), pois, nos termos do art. 1.018 do CPC/1973 (art. 643 do CPC/2015),
constitui ônus do credor não admitido no inventário o ajuizamento da respectiva
ação de conhecimento, não competindo ao juiz a conversão do pedido de
habilitação na demanda a ser proposta, em substituição às partes. 3. São
incabíveis honorários de advogado em incidente de habilitação de crédito em
inventário que seja extinto por objeção de alguma parte interessada, porquanto
não resolvido nenhum litígio pelo juiz, não se podendo falar em vencedor e
vencido. Somente com a abertura da via ordinária é que será efetiva e
definitivamente resolvido o litígio verificado no plano material acerca do
direito do credor em face do espólio, oportunidade em que, aí sim, serão
fixados os respectivos honorários. 4. Ao juízo universal do inventário compete
a apreciação das questões afetas ao inventário (arts. 984 do CPC/1973 e 612 do
CPC/2015), ressalvadas as questões de alta indagação, cabendo-lhe a anulação,
de ofício, de escritura pública de inventário extrajudicial celebrada com a
intenção de fraudar lei imperativa, mediante abuso de direito (art. 187 do CC),
nos termos do art. 168, parágrafo único, do CC, porquanto nulo o negócio
jurídico (art. 166, IV, do CC). Assim, revela-se prescindível pedido específico
das partes, não havendo que se falar em julgamento extra petita. 5. Sobressai
nítida a litigância de má-fé dos ora recorrentes, a ensejar a condenação ao
pagamento de multa e de indenização à parte adversa, nos moldes dos arts. 18 do
CPC/1973 e 81 do CPC/2015, tendo em vista a clarividente intenção de se furtarem
ao cumprimento da obrigação imputável ao espólio, alterando a verdade dos
fatos, diante da omissão intencional, perante o tabelião, do crédito demandado
em desfavor do espólio, bem como o tumulto processual causado na ação de
inventário e no correlato incidente de habilitação de crédito, a caracterizar
procedimento temerário das partes. 6. Recurso especial parcialmente provido.
(STJ – Terceira Turma – RECURSO ESPECIAL Nº 2045640 – GO (2018/0076281-8) Rel.
min. Marco Aurélio Bellizze – j. 25 de abril de 2023).
Extrai-se do voto do relator o
seguinte entendimento:
“Relativamente ao pagamento das
dívidas dos credores do espólio, o diploma processual de 1973, vigente à data
de prolação da sentença (2/4/2012), facultava ao credor, antes da partilha,
requerer ao juízo do inventário o pagamento das suas dívidas vencidas e
exigíveis, através do incidente de habilitação de crédito acompanhado de prova
literal da dívida (art. 1.017 do CPC/1973 e art. 642 do CPC/2015) ou de
documento que constitua prova bastante da obrigação (art. 1.997, § 1º, do CC),
a ser autuado em apenso aos autos do inventário.
………..
Dessume-se da leitura dos
supracitados dispositivos legais que, concordando as partes interessadas
(credores e herdeiros) com o pedido, o juiz, ao declarar habilitado o credor,
mandará que se faça a separação de dinheiro ou, em sua falta, de bens
suficientes para o seu pagamento, determinando, em seguida, a sua alienação ou,
caso requeira o credor, lhe sejam adjudicados os bens já reservados para o seu
pagamento, em vez do recebimento de dinheiro, desde que a esse respeito
concordem todas as partes (arts. 1.017, §§ 2º a 4º, do CPC/1973; e 642, §§ 2º a
4º, do CPC/2015).
Havendo discordância de alguma
parte quanto ao crédito, será o credor remetido às vias ordinárias, afigurando-se
possível ao juiz, na oportunidade, a reserva, em poder do inventariante, de
bens suficientes para pagar o credor quando a dívida constar de documento que
comprove suficientemente a obrigação e a impugnação não se fundar em quitação,
nos termos dos arts. 1.018 do CPC/1973 e 643 do CPC/2015, in verbis: CPC/1973:
Art. 1.018. Não havendo
concordância de todas as partes sobre o pedido de pagamento feito pelo credor,
será ele remetido para os meios ordinários. Parágrafo único. O juiz mandará,
porém, reservar em poder do inventariante bens suficientes para pagar o credor,
quando a dívida constar de documento que comprove suficientemente a obrigação e
a impugnação não se fundar em quitação. CPC/2015:
Art. 643. Não havendo
concordância de todas as partes sobre o pedido de pagamento feito pelo credor,
será o pedido remetido às vias ordinárias. Parágrafo único. O juiz mandará,
porém, reservar, em poder do inventariante, bens suficientes para pagar o credor
quando a dívida constar de documento que comprove suficientemente a obrigação e
a impugnação não se fundar em quitação.
Nessa situação, o credor excluído
deverá ajuizar a ação ordinária cabível (cobrança, monitória, execução etc), no
prazo de 30 (trinta) dias contados da data em que foi intimado da decisão
(arts. 1.039, I, do CPC/1973; e 668, I, do CPC/2015), sob pena de perda de
eficácia da reserva de bens eventualmente decretada pelo magistrado.
A título elucidativo,
transcrevem-se o teor desses artigos:
CPC/1973: Art. 1.039. Cessa a
eficácia das medidas cautelares previstas nas várias seções deste Capítulo: I –
se a ação não for proposta em 30 (trinta) dias, contados da data em que da
decisão foi intimado o impugnante (art. 1.000, parágrafo único), o herdeiro
excluído (art. 1.001) ou o credor não admitido (art. 1.018);
CPC/2015: Art. 668. Cessa a
eficácia da tutela provisória prevista nas Seções deste Capítulo: I – se a ação
não for proposta em 30 (trinta) dias contados da data em que da decisão foi
intimado o impugnante, o herdeiro excluído ou o credor não admitido;
Denota-se, assim, que a própria
lei confere ao credor excluído do inventário o ônus de ajuizar a ação de
conhecimento respectiva (com o propósito de recebimento do seu crédito),
sobretudo dentro do trintídio legal quando pretender manter a eficácia da
tutela assecuratória eventualmente concedida – de reserva de bens –, sendo
defeso ao juiz determinar a conversão da habilitação de crédito em ação de
cobrança, em substituição às partes.
……………………
- Conclusão Ante o exposto, dou parcial provimento ao
recurso especial, a fim de extinguir o incidente de habilitação de crédito
em inventário, sem resolução do mérito, reconhecendo-se a necessidade de
propositura da respectiva ação ordinária pelo credor excluído, ficando
mantida, no mais, a sentença e o acórdão recorrido quanto à reserva de
bens, à anulação da escritura pública de inventário extrajudicial e à
má-fé dos recorrentes, ciente o credor dos termos dos arts. 1.039, I, do
CPC/1973 e 668, I, do CPC/2015, sob pena de caducidade da reserva de bens
determinada pelo juízo do inventário. É o voto”
STJ
REsp 2.045.640
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