STJ Na responsabilidade civil dos pais pelos atos praticados pelos filhos menores não há litisconsorte
Em ação indenizatória decorrente
de ato ilícito, não há litisconsórcio necessário entre o genitor responsável
pela reparação (art. 932, I, do CC) e o menor causador do dano. É possível, no
entanto, que o autor, por sua opção e liberalidade, tendo em conta que os
direitos ou obrigações derivem do mesmo fundamento de fato ou de direito (art.
46, II, CPC/73) intente ação contra ambos – pai e filho -, formando-se um
litisconsórcio facultativo e simples.
A principal discussão dos autos
está em definir se, em ação indenizatória, há litisconsórcio necessário do pai
por apontado ato ilícito cometido por seu filho – menor -, nos termos do art.
932, I do Código Civil. Em regra, no âmbito da responsabilidade civil há
responsabilização direta daquele que deu causa ao prejuízo e, por conseguinte,
que se tornará obrigado a responder pelos danos. A legislação brasileira também
sempre previu a responsabilidade civil por fato de outrem, tendo o Código Civil
de 2002 deixado para trás a presunção de culpa da codificação anterior
(culpa in vigilando ou in eligendo), para
consagrar a responsabilidade objetiva, também nominada de indireta ou complexa,
pelas quais as pessoas arroladas responderão, na correspondência do comando
legal (art. 932), desde que provada a culpa daqueles pelos quais são
responsáveis (En. 451 das Jornadas de Direito Civil do CJF). O rol do
dispositivo em apreço veicula hipóteses taxativas, dentre as quais a
responsabilidade civil dos pais pelos atos praticados pelos seus filhos menores
que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia. Nessa ordem de ideias, o
ponto crucial da controvérsia exsurge da redação do art. 928 do Código Civil,
trazendo importante inovação legislativa, prevendo a possibilidade de
responsabilização civil do incapaz, verbis: Art. 928. O
incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis
não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes.
Parágrafo único. A indenização prevista neste artigo, que deverá ser
eqüitativa, não terá lugar se privar do necessário o incapaz ou as pessoas que
dele dependem. Percebe-se nitidamente do dispositivo em exame que há
responsabilidade subsidiária, tendo o art. 928 substituído o princípio da
irresponsabilidade absoluta da pessoa privada de discernimento (em razão de
idade ou falha mental) pelo princípio da responsabilidade mitigada e
subsidiária. Em sendo assim, não há obrigação – nem legal, nem por força da
relação jurídica (unitária) – de a vítima lesada litigar contra o responsável e
o incapaz, não sendo necessária, para a eventual condenação, a presença do
outro, não havendo falar em litisconsórcio passivo necessário e muito menos em
nulidade do processo. No entanto, é possível que o autor, por sua opção e
liberalidade, tendo como fundamento o fato de “os direitos ou obrigações
derivarem do mesmo fundamento de fato ou de direito” (art. 46, II, CPC/73)
intente ação contra ambos – pai e filho -, formando-se um litisconsórcio
facultativo – propondo demandas distintas contra o incapaz ou seu
representante, não sendo necessária, para a condenação, a presença do outro – e
simples – a decisão não será necessariamente idêntica quanto ao incapaz e ao
representante. Com efeito, em síntese, aquele que sofre um dano causado por
incapaz deve buscar a reparação ajuizando ação em face do responsável pelo
incapaz, pois em relação a este último é subsidiária. Nada impede que o lesado
proponha ação em face do responsável pelo incapaz e também em face do próprio
infante, se assim desejar e for de sua conveniência. Caso a vítima opte por
demandar desde logo o incapaz e o seu responsável, segundo doutrina, “pode
fazer um cúmulo eventual de pedidos a que se refere o art. 289 do Código de
Processo Civil. O primeiro pedido deve ser de condenação dos responsáveis pelo
incapaz a reparar o dano. O segundo pedido deve ser formulado para, na
eventualidade de não ser possível aos responsáveis pelo incapaz reparar o dano
por insuficiência de meios ou por restar comprovado que eles não tinham a
obrigação de indenizar, o próprio incapaz ser condenado a reparar o dano. A
somatória da pluralidade de partes (litisconsórcio) e do cúmulo de pedidos a
que se refere o art. 289 do Código de Processo Civil recebe o nome de litisconsórcio
eventual. Por outro lado, aquele que foi lesado pode optar por propor ação
apenas em face dos responsáveis pelo incapaz”. Nessas circunstâncias, o autor
estará, sabidamente, com relação ao menor, ciente de que este patrimônio só
será atingido subsidiariamente e de forma mitigada; por outro lado, em caso de
improcedência da primeira demanda contra o representante, terá afastado o
inconveniente de ter que propor nova ação em face do incapaz.
Veja o acórdão:
DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE
CIVIL POR FATO DE OUTREM – PAIS PELOS ATOS PRATICADOS PELOS FILHOS MENORES. ATO
ILÍCITO COMETIDO POR MENOR. RESPONSABILIDADE CIVIL MITIGADA E SUBSIDIÁRIA DO
INCAPAZ PELOS SEUS ATOS (CC, ART. 928). LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO.
INOCORRÊNCIA.
1. A responsabilidade civil do incapaz pela reparação dos danos é subsidiária e
mitigada (CC, art. 928).
2. É subsidiária porque apenas ocorrerá quando os seus genitores não tiverem
meios para ressarcir a vítima; é condicional e mitigada porque não poderá
ultrapassar o limite humanitário do patrimônio mínimo do infante (CC, art. 928,
par. único e En. 39/CJF); e deve ser equitativa, tendo em vista que a
indenização deverá ser equânime, sem a privação do mínimo necessário para a
sobrevivência digna do incapaz (CC, art. 928, par. único e En. 449/CJF).
3. Não há litisconsórcio passivo necessário, pois não há obrigação – nem legal,
nem por força da relação jurídica (unitária) – da vítima lesada em litigar
contra o responsável e o incapaz. É possível, no entanto, que o autor, por sua
opção e liberalidade, tendo em conta que os direitos ou obrigações derivem do
mesmo fundamento de fato ou de direito (CPC,73, art. 46, II) intente ação
contra ambos – pai e filho -, formando-se um litisconsórcio facultativo e
simples.
4. O art. 932, I do CC ao se referir a autoridade e companhia dos pais em
relação aos filhos, quis explicitar o poder familiar (a autoridade parental não
se esgota na guarda), compreendendo um plexo de deveres como, proteção,
cuidado, educação, informação, afeto, dentre outros, independentemente da
vigilância investigativa e diária, sendo irrelevante a proximidade física no
momento em que os menores venham a causar danos.
5. Recurso especial não provido.
(REsp n. 1.436.401/MG, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma,
julgado em 2/2/2017, DJe de 16/3/2017.)
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