Admite forçar o comprador de veículo
financiado perante terceiros a colocar o financiamento no seu nome ou efetuar o
pagamento das parcelas do financiamento.
A Terceira Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) decidiu que é cabível ação para cumprimento de obrigação de fazer
com o objetivo de forçar o comprador de diversos veículos financiados perante
terceiros a colocar o financiamento no seu nome ou efetuar o pagamento das
parcelas do financiamento.
O colegiado reformou acórdão do Tribunal de
Justiça do Paraná (TJPR) que havia entendido não ser processualmente adequado o
pedido formulado pela recorrente, já que não pretendia a resolução do contrato,
mas o cumprimento da obrigação de fazer consistente no pagamento, pelo
recorrido, das parcelas dos financiamentos.
Segundo o relator, ministro Paulo de Tarso
Sanseverino, nem sempre é possível o enquadramento das obrigações nas
modalidades doutrinariamente previstas, o que pode provocar “tormento” a quem
“vê o seu direito afrontado, mas não consegue identificar a ação adequada para
cessação do ilícito”.
“O artigo 461 do Código de Processo Civil de
1973 é claro ao reconhecer que a tutela jurisdicional a ser prestada será a
tutela específica ou, uma vez procedente o pedido, providências que assegurem o
resultado prático equivalente ao do adimplemento”, explicou o ministro.
Pressão
psicológica
Uma empresa de transportes vendeu 13 caminhões
e 24 semirreboques a outra empresa. Para fechar o negócio de R$ 4,7 milhões, a
vendedora recebeu R$ 900 mil e a promessa do comprador de que o restante da
dívida seria pago mediante quitação das parcelas do financiamento preexistente
com instituições financeiras ou com a transferência da dívida para a
titularidade do comprador.
Com o inadimplemento do financiamento, a
empresa vendedora entrou com ação pedindo o cumprimento da obrigação de fazer.
Para solucionar a controvérsia, Sanseverino considerou obrigação de fazer
aquela em que o devedor se obriga a saldar mensalmente junto a terceiro o
financiamento dos bens por ele adquiridos, mas que se encontra ainda em nome do
vendedor.
“Se não há obrigação de pagar a ser executada,
pois o credor/vendedor já havia recebido os valores que a ele deveriam ser
pagos pelo recorrido quando da venda dos veículos, é possível identificar
obrigação de fazer o pagamento mensal do financiamento contratado com o
vendedor a terceiro e, assim, permitir a aplicação do procedimento e dos
instrumentos de efetivação do direito material”, ressaltou.
Para o ministro, é possível utilizar a ação de
cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer de modo a impingir no devedor,
“mediante instrumentos de pressão psicológica, o desejo de adimplir com o
contrato a que se obrigou”.
Por unanimidade, a Terceira Turma reformou a
decisão extintiva do TJPR, determinando o prosseguimento da ação e o retorno
dos autos ao tribunal de origem para análise do pedido de reforma da tutela
antecipada concedida. Restou assim ementada:
RECURSO ESPECIAL.
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PRETENSÃO DE
CONSTRIÇÃO DO RÉU AO CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO CONTRATUALMENTE ESTABELECIDA.
COMPRA E VENDA DE VEÍCULOS.
OBRIGAÇÃO DE
PAGAR CUMPRIDA. OBRIGAÇÕES ALTERNATIVAS CONSISTENTES NO ADIMPLEMENTO PAULATINO
DOS CONTRATOS DE FINANCIAMENTO DOS VEÍCULOS ADQUIRIDOS JUNTO ÀS CREDORA OU DE
CESSÃO DA POSIÇÃO PASSIVA NESSES CONTRATOS DE FINANCIAMENTO. INADIMPLEMENTO
DESTAS OBRIGAÇÕES.
1. Controvérsia
em torno do cabimento de ação para cumprimento de obrigação de fazer para
compelir o comprador de diversos veículos financiados perante terceiros a
proceder à cessão dos financiamentos, ou, periodicamente, efetuar o
adimplemento das parcelas do financiamento, tendo sido ambas as obrigações
inadimplidas.
2. O perfeito
enquadramento das obrigações nas modalidades doutrinariamente previstas nem
sempre é possível e, por vezes, provoca tormento àquele que vê o seu direito
afrontado, mas não consegue identificar a ação adequada para cessação do
ilícito. 3.
Sendo a obrigação
de fazer a determinação de uma conduta, na espécie, conforme o contrato
celebrado, a consubstancia o comportamento atribuído ao comprador de proceder à
cessão dos financiamentos dos veículos adquiridos, o que não dependia apenas de
sua vontade, ou de, periodicamente, proceder ao adimplemento do financiamento
na forma contratada junto a terceiros.
4. Possível
categorizar como obrigação de fazer aquela em que o devedor se obriga a saldar
mensalmente junto a terceiro o financiamento dos bens por ele adquiridos, mas
que se encontra ainda em nome do vendedor.
5. Na perspectiva
de sobrelevo do direito material e da adaptação dos meios processuais
existentes para a repressão do ilícito, razoável a utilização da ação de
obrigação de fazer na espécie, notadamente, em face do eficaz meio de
concitação ao cumprimento consubstanciado na aplicação de multa diária.
6. Decretada a
extinção de ofício do processo em sede de agravo de instrumento interposto
contra a decisão que concedera a tutela antecipada, deve ser reformada a
decisão extintiva, determinando-se o prosseguimento da ação, retornando os
autos ao Tribunal de origem para que se analise o pedido de reforma da tutela
antecipada concedida.
7. RECURSO
ESPECIAL PROVIDO.
(REsp 1528133/PR,
Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em
12/06/2018, DJe 15/06/2018)
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