As regras previstas pela Convenção de Montreal são
aplicáveis aos casos de transporte aéreo internacional de cargas enquanto os
bens permanecerem sob custódia da transportadora, o que pode ocorrer mesmo após
o descarregamento em aeroporto brasileiro.
Nessas situações, estando a carga sob
responsabilidade da transportadora, não se aplicam as normas do Código Civil, e
também não se aplicam os dispositivos do Código de Defesa do Consumidor (CDC)
para embasar pretensões indenizatórias relacionadas a ilícito contratual
praticado pela transportadora durante as formalidades aduaneiras.
Com base nesses entendimentos, a Terceira Turma do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) afirmou que as regras de direito
internacional previstas na Convenção de Montreal prevalecem em relação às de
direito interno, e por isso deu provimento a um recurso da UPS do Brasil
Remessas Expressas para julgar improcedente a ação de indenização proposta por
uma cliente devido a atrasos na liberação da carga transportada dos Estados
Unidos para o Brasil.
A carga chegou ao país em dezembro de 2007, e a
demanda foi proposta em março de 2010, fora do prazo de dois anos previsto na
Convenção de Montreal para ajuizamento da ação.
Os ministros reconheceram a prescrição bienal, nos
termos da convenção. O tribunal de origem, apesar de afastar a aplicação do
CDC, havia permitido o prosseguimento da demanda por entender que a relação
coberta pela convenção tinha sido encerrada com o descarregamento da carga, o
que levaria à aplicação das regras de prescrição do Código Civil.
Bens sob custódia
Segundo o ministro relator do recurso especial,
Paulo de Tarso Sanseverino, ao contrário do que entendeu o tribunal de origem,
o vínculo jurídico do contrato de transporte internacional de cargas perdura
“enquanto a carga permanecer sob custódia da transportadora”, o que pode
ocorrer mesmo após a saída dos bens do avião.
“Não basta o simples descarregamento da aeronave
para se encerrar o contrato de transporte, sendo necessário, ainda, que a carga
seja recebida por quem de direito no aeroporto, para só então sair da custódia
da transportadora, encerrando a execução do contrato de transporte”, disse.
Na visão do relator, é inviável a conclusão do
tribunal de origem, de aplicar o prazo prescricional trienal do Código Civil,
possibilitando o prosseguimento da demanda. A empresa cliente alegou que uma
classificação equivocada feita pela UPS do Brasil acarretou custos adicionais
de armazenamento enquanto os bens aguardavam o despacho aduaneiro, gerando
direito à indenização.
STF
No voto acompanhado pela unanimidade do colegiado,
Sanseverino observou que, ao contrário do CDC, a Convenção de Montreal prevê a
responsabilidade subjetiva da transportadora em casos análogos.
De acordo com o ministro, a incidência da
legislação de consumo ao caso poderia conduzir a uma responsabilidade objetiva
do transportador, “resultado manifestamente não desejado” pelos países
signatários da convenção internacional, o que reforça a necessidade de sua
aplicação em vez das normas de direito interno.
O relator destacou que o Supremo Tribunal Federal
(STF) decidiu, em repercussão geral, que as Convenções de Montreal e Varsóvia
prevalecem ante o CDC nos casos em que consumidores buscam indenização por
danos materiais decorrentes de extravio de bagagem em voos internacionais (Tema 210/STF).
Sanseverino lembrou que a prevalência da norma
internacional em relação às de direito interno encontra amparo no artigo 178 da Constituição Federal, e a decisão do
STF demonstra preocupação com o descumprimento de acordos internacionais no
setor aéreo.
Leia
o acórdão.
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